Medicina e Saúde

Pesquisa inédita revela bactérias resistentes no Brasil

Recente estudo realizado pelo Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC) em todo o Brasil revelou a mutação e a disseminação da bactéria Acinetobacter spp. ou Acinetobacter multirresistente, responsável por 11% das infecções hospitalares e resistente a 80% dos antibióticos. O estudo é inédito na América Latina e seus resultados confirmam um problema que atinge todo o planeta, com o crescente número de bactérias multirresistentes.

A pesquisa desenvolvida pelo LNCC, alerta para a necessidade do uso racional dos antibióticos e a aplicação de políticas comuns de controle de infecção em ambientes hospitalares em todo o Brasil. O trabalho foi iniciado em 2014, com amostragens em nove hospitais distribuídos no Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Pará, São Paulo e Distrito Federal.

Em cada um deles, um infectologista e um microbiologista se responsabilizaram pela identificação e caracterização da bactéria e suas resistências. Os profissionais lotados nesses hospitais são coautores do estudo. As descobertas reiteram os resultados prévios de estudos já realizados e que apontaram o aumento dos casos de resistência aos antibióticos por determinados tipos de bactérias em UTIs de todo o território brasileiro.

Em comunicado divulgado pela Assessoria de Imprensa do órgão, a coordenadora do estudo, Ana Tereza Vasconcelos, chefe do Laboratório de Bioinformática do LNCC, advertiu: “A bactéria Acinetobacter causa infecção hospitalar e está se tornando cada vez mais resistente a todos os antibióticos. É um problema que era mais ou menos comum em países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, mas agora é um problema de saúde pública mundial“.

Projeto-piloto

Segundo ela, este é um projeto-piloto e o objetivo é ampliá-lo para outras unidades hospitalares em todo o País. “O que fizemos foi identificar e caracterizar as bactérias e as resistências delas em relação aos antibióticos”.

Afirmou a pesquisadora, acrescentando que “a Acinetobacter produz uma enzima chamada OXA-23 que leva à resistência aos carbapenens. Além desta enzima, identificamos também, em diferentes hospitais de São Paulo, uma nova enzima, a OXA-72. Somente dois antibióticos são capazes de controlá-la e matá-la: a tigeciclina e a polimixina”.

Para Ana Tereza, “este achado é preocupante, porque as bactérias podem trocar resistência entre si, e outra bactéria passar a produzir esta”. De 1997 a 2010, os casos de resistência bacteriana associados à disseminação da OXA-23 e outros clones de patógenos saltaram de 12,6% para 71,4%. As espécies de Acinetobacter são resistentes a vários antibióticos, como a penicilina, o cloranfenicol e os carbapenens, que são reconhecidos como o tratamento “chave” ou de última escolha.

Estudos e pesquisas preocupam a comunidade científica em todo o mundo. O sinal vermelho para o crescimento crítico na resistência aos antibióticos em linhagens de Acinetobacter tem sido dado pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos.

Por outro lado, a Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou dados de uma análise feita em 114 países apontando uma situação alarmante diante da resistência bacteriana em todo o planeta.

Ana Tereza enfatiza que “a Acinetobacter apresenta a quarta maior prevalência dentre os patógenos bacterianos que causam infecção hospitalar, e não há muitos estudos sobre ela e nem sobre como está se disseminando no Brasil”.

Segundo ela, a primeira desse ranking é a Klebsiella pneumoniae carbapenemase, conhecida como KPC, e tem várias resistências. Entretanto, vem sendo objeto de pesquisa por vários grupos. Mas, neste caso, há muitos grupos debruçados nas pesquisas. A gravidade da situação, porém, ressalta, é que “essas bactérias moram dentro das UTIs e quanto mais debilitada a pessoa estiver, maior será o risco de morte. A Acinetobacter pode matar em até 72 horas”.

Prescrição desnecessária

Coautora da pesquisa e infectologista da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Ana Gales, autoridade no Brasil no estudo de resistência bacteriana, destaca que o uso indiscriminado desses medicamentos, com a prescrição desnecessária por médicos e pacientes que não concluem os tratamentos, acelera a resistência bacteriana.

Conforme declarou à Ascom, “muitas vezes o paciente acaba morrendo não da doença, e sim por conta da infecção causada pela bactéria. Habitualmente, a Acinetobacter raramente coloniza o ser humano. Uma pequena porcentagem de pessoas será contaminada, principalmente, os pacientes imunologicamente debilitados”.

– Quando o paciente fica internado, naturalmente, acaba recebendo medicação antimicrobiana e, com isso, as bactérias que colonizam o corpo humano acabam sendo destruídas, abrindo a chance para que bactérias presentes no ambiente hospitalar possam colonizar o paciente. A gente pode prevenir um grande número de casos, mas não todos. O paciente está intubado, recebeu antibiótico, fez cirurgia, ou seja, vai acumulando fatores de risco, e isso acaba facilitando a infecção – concluiu.

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